NA: #iHunt é um jogo mais maduro, portanto sua resenha também será. Contem altos níveis de sarcasmo e baixo calão.

No século 21, tudo parece muito fácil: o capitalismo tardio das dotcom mostrou o caminho, apesar da bolha. Virou quase uma regra 34 da vida: se pode ser feito, alguém já fez uma app de celular para gerenciar quem faz aquilo.

A maior rede de hotéis não tem um quarto de hotel.

A maior rede de entregas não possui um carro de entrega.

A maior rede de taxis não tem um taxi.

A maior rede de caçadores de monstros não tem um caçador contratado.

Sim… Monstros existem, e não apenas os burgueses do caralho que pagam milhares de dólares no copo de um café com grãos cagado por passarinhos.

Desde o início da existência humanos, os monstros existem, em todas as suas formas e tipos. Claro, nem todos são criaturas assombrosas destruidoras de mentes. E nem todas são material de fanfic de Crepúsculo. Mas todos precisam saciar sua fome, não importa sua origem: mesmo aqueles que surgem a partir de desastres corporativos (sim, eles acontecem) precisam se alimentar.

E claro que tem gente que quer se livrar dessas encrencas.

E com o menor custo possível.

E por que não trabalhar na “economia do compartilhamento” (que piada) e colocar em uma app o pedido de “ajuda contra o vampiro que quer chupar minha irmã”?

Azar do bando de fodidos que vão se tretar com o vampiro. Ninguém mandou não estudar em boas faculdades: afinal, é só se esforçar o suficiente e tudo dá certo, né?

Meu pau de óculos!

Preparando a caçada

#iHunt – Hunting Monsters on the Gig Economy (Caçando Monstros na Economia do Compartilhamento) é um dos mais interessantes jogos que saíram recentemente. Baseado em uma série de livros da mesma autora disponíveis também em seu itch.io, basicamente ele é um jogo sobre millenials.

Não… Não estamos falando de millenials que tomam café de grãos cagado por pássaros em copos de papel reciclável ou feitos de juta colhida de maneira ambientalmente sustentável por ribeirinhos da Amazônia.

Esses com certeza tem grana o bastante para não precisarem se envolver com #iHunting, a não ser para encomendar serviços.

Os millenials aqui são aqueles que o liberalismo econômico, somado com o conservadorismo social, literalmente tem fodido: aqueles que não se qualificam como parte da classe média alta.

#iHunting não é para Faria Limers.

Normalmente, o #iHunter típico é alguém que precisa desesperadamente de dinheiro, ao ponto de considerar arriscar o próprio pescoço caçando monstros. Uma pessoa pode ter tido contato com monstros e nem por isso tornar-se um #iHunter: é necessário um certo grau de desespero para colocar-se diante de uma criatura que pode arrancar sua cabeça e manter você vivo o suficiente para ver seu corpo esviscerado cair no chão.

Nada que alguns anos de empréstimo estudantil e cartões de crédito atrasados não façam. Ou ser expulso de casa por causa do babaca do pai abusivo e/ou misógino e/ou homofóbico e/ou “Cidadão de Bem®” e precisar ratear o aluguel de uma casa com alguns amigos.

Pessoas ignoradas pela sociedade: LGBTs, negros, pessoas sem um grau de instrução elevada E/OU com contatos certos em empresas de ponta. Ou seja, pessoas sem “mérito”.

Claro… Na teoria, seu emprego diário deveria bancar seu sustento e mais, mas a verdade é que os empregos atuais, com sua precarização cada vez maior e salários cada vez menores, estão empurrando as pessoas para o abismo social. O neoliberalismo acabou com o colchão social, a rede de proteção que fazia com que a pessoa pudesse, de repente, passar alguns meses sem emprego se especializando para tentar algo novo: agora é cobra comendo cobra. E o dinheiro do trabalho das 7 às 5 permite apenas sobreviver e olhe lá.

Claro que, com o tempo, formaram-se agrupamentos de #iHunters, e até mesmo algumas categorizações dos mesmos baseados em suas estratégicas de caçada, mas mesmo isso não é algo formal, mas uma linguagem própria surgida da troca de informações importantes para a sobrevivência. Seres humanos são sociais e se agrupam conforme a necessidade. Tudo depende de saber qual é o seu Lance.

Apenas torça para que você não tenha sua “luta justa” contra um vampiro/lobisomem/demônio/coisa-bizonha-que-quer-seu-cérebro-como-comida-e-corpo-como-roupa. Isso pode ser o seu fim.

Instalando o App

#iHunt é um jogo baseado em Fate Básico, mas com algumas diferenças, em especial na criação dos Monstros, sobre a qual falaremos adiante.

Inicialmente, todo #iHunter possui 6 Aspectos: além de dois livres a serem usados no final da criação de personagem, e do tradicional Conceito, temos o Drama, que substitui a Dificuldade com o mesmo objetivo: ser aquela pedra no sapato que ferra você vira e mexe, como “Vivendo em uma ocupação por vontade própria” ou “Me apaixono fácil”.

Além disso, dois Aspectos importantes são o seu Objetivo Real (Vision Board) e seu Trabalho Diurno (Daily Job)

O Objetivo Real é algo que você mira com muita intensidade: de certa forma, é algo que você deseja tanto, que é quando você acha que vai “vencer na vida”. Obviamente, você ainda não tem isso, mas é o símbolo máximo de sucesso que você pode imaginar, ao menos no momento. Pode ser qualquer coisa, como Uma Casa no Campo onde possa plantar meus amigos, meus discos e livros e nada mais, Uma Família de Verdade ou mesmo Que meu corpo reflita minha alma. O importante é que tem que ser algo que simbolize um desejo tão profundo que possa ser em muitos momentos o que vai fazer você se enfiar em #iHunting para tentar conseguir.

Já o Trabalho Diurno é o que você faz “de verdade”. Na moral, #iHunt não é exatamente uma forma segura de sobrevivência… E não apenas por causa dos monstros. Os clientes podem dar uma avaliação ruim e com isso o valor da caçada cair. O seu banco pode achar que o #iHunt é uma forma de lavagem de dinheiro e não permitir a grana entrar na tua conta. E mesmo com tudo isso, pode passar semanas sem que você encontre uma caçada que compense, considerando sua habilidade e valores. Você vai precisar de uma forma de se sustentar nesse meio tempo, e essa é o seu Trabalho Diurno. Na prática pode ser de tudo, de Reparar Celulares na 25 de Março a Youtuber em vias de se tornar famosa (#sqn) até mesmo a Princesa Disney de Festa Infantil ou VASP – Vagabundo Anônimo Sustentado pelo Pai. Não importa o que, essa é a forma que você tem de ganhar algum dinheiro para se virar, enquanto faz seus corres.

Além disso, nesse momento ou antes dele, você deve definir qual é o seu Lance (Kink). O Lance é como você caça monstros: os #iHunters se “dividem” em grupos informais por meio dos Lances, ainda que exista muito cruzamento entre os #iHunters ao ponto de que os Lances não sejam fixos o bastante para serem grupos formais, mas mais maneiras gerais de dizer sobre o estilo e método de cada #iHunter.

Ao escolher um Lance, você recebe uma Façanha exclusiva daquele Lance e destranca a possibilidade de comprar outras conforme evoluir como #iHunter. Os Lances são:

  • Cavaleiros (Knights): o básico caçador de monstros. Se tem uma forma de matar o monstro na porrada, é assim que o Cavaleiro vai fazer. Senão, ele descobre como abrir uma brecha e aí então sentar a porrada no monstro. Pense em Buffy ou nos irmãos Winchester de Supernatural;
  • Evileenas: chamados assim por causa de uma personagem de um filme trash do cenário, são os que buscam mais o conhecimento sobre os monstros, e algumas vezes até mesmo descobrem como operar magia ou coisas similares para enfrentar os monstros em seu próprio território. Pense em Giles de Buffy ou em John Constantine;
  • Phooeys: os phooeys são um fenômeno da nossa era hiperconectada. Teóricos de Conspiração, hackers, cyberativistas que se envolveram com monstros e assim por diante, os phooey montaram toda uma rede de servidores mesh conectados na deep web usando serviços de redes sociais descentralizadas ao exemplo do Mastodon ou do Scuttlebutt para facilitar a troca de informações sobre monstros e de formas de tecnologias para lidar com eles. Provavelmente é a ele que você vai recorrer quando precisar de uma cópia PDF do Malleus Malleficarum ou para criar um dispositivo para capturar demônios. Pense nos Caça-Fantasmas com um pouco da Penelope Garcia de Criminal Minds;
  • Os 66: formaram-se após uma série de eventos bizarros que sempre envolveram de uma forma ou de outra o número 66, como assassinatos cuja vítima recebeu exatos 66 golpes de faca, ou 66 igrejas queimadas ao mesmo tempo em diversos estados, os 66 lutam de maneira comunitária, agrupando-se e formando resistências para quebrar o sistema. Anarquistas, revolucionários, eles conseguem vencer por meio da destruição e reconstrução e são especialistas em achar brechas de algo e aproveitar contra elas. Monstro, governos, países, redes… Se existe uma porta, eles arrombam. Se não existe, eles criam uma e a arrombam. Pense nos Pistoleiros Solitários de Arquivo X;

Perceba que o fato de você estar em um Lance específico não quer dizer que você não possa aprender habilidades fora do que seria normal… Como diria o famoso xamã cobra Ess El-El de Shadowrun, “aprenda o que puder, porque na rua burrice mata mais rápido que bola de fogo”. A mesma regra vale para o #iHunt: mesmo que você seja um Evileena, é sempre bom aprender como lutar, afinal o monstro não vai cair sozinho, e aquele ritual que você pesquisou de nada vai adiantar se suas tripas estiverem para fora. Por outro lado, se você for um Cavaleiro, ficar batendo que nem um imbecil em um inimigo sobre o qual você nada conhece pode ser uma passagem só de ida para o Além, portanto conhecer um truque aqui ou ali de um Evileena ou 66 ajuda bastante.

E aqui temos outra mudança em #iHunt. Ao invés de vir com perícias, em #iHunt você tem pacotes de perícias que de certa forma permeiam ideias envolvendo certos tipos de profissões, como Ativista, Guerreiro, Trapaceiro, Influenciador ou até mesmo Serviço Social. Ao realizar um rolamento, você irá ver qual profissão é mais condizente com isso, ainda que existam referências.

A Vantagem

Uma regra importante surge na questão dos rolamentos de dados: uma luta entre #iHunters e monstros NUNCA É JUSTA. Dizer que “fulano teve uma luta justa” dentro do linguajar dos #iHunters é dizer que ele morreu. E em termos de regras, o #iHunt traz uma mecânica para simular isso que é A Vantagem (Edge).

A Vantagem representa a mão superior que um lado tem sobre o outro em conflitos. Normalmente os monstros terão a Vantagem de partida (isso fica a critério do Narrador), mas os #iHunters possuem todo tipo de mecanismo para tomar para si A Vantagem: pesquisar fraquezas, preparar armadilhas, colocar-se em locais onde podem atacar de maneira segura, tudo isso pode fazer com que os #iHunters tenham a vantagem sobre os monstros.

Enquanto tiver com a vantagem, qualquer personagem daquele lado pode utilizar uma primeira vez a mesma sem precisar pagar PDs para a usar (demais usos são ao custo de 1 PD). Sempre que usar a Vantagem, o personagem que o fizer substitui 1 dado Fate por 1 dado comum de 6 lados (d6), portanto rolando 3dF+1d6 ao invés de 4dF.

Isso gera uma grande vantagem mecânica, já que o valor médio do rolamento com vantagem estará quase no vale positivo do rolamento comum. Perceba que nessa situação da vantagem, existe menos de 20% de chance do rolamento sair com menos de +2, enquanto em um rolamento tradicional existe menos de 20% de sair +2 ou melhor (consulte os links se não acredita).

Essa variação faz com que monstros se tornem muito poderosos e ter-se a vantagem seja algo importantíssimo para um caçador caçar um monstro, já que às vezes é a diferença entre a vida e a morte do seu caçador. Para pegar a Vantagem para si, existem três formas.

A primeira é por meio de rolamentos de Superar contra um rolamento de defesa do monstro ou seu “nível de ameaça” (Star rating, mais sobre isso adiante), o que for maior.

A segunda é que certos Poderes e Características dos Monstros demandam que eles passem a Vantagem para a oposição ao utilizar tais poderes.

A terceira é caso você consiga uma defesa avassaladora (overwhelming defense) contra quem está com a Vantagem. Isso ocorre quando você é bem-sucedido com estilo na Defesa contra um ataque onde o alvo detém a Vantagem (não necessariamente a usou). Ao conseguir, você toma a Vantagem para si.

Uma coisa importante é que a Vantagem nunca é tomada para um indivíduo, mas sim para um lado: se tiverem quatro #iHunters contra um monstro e um dos #iHunters conseguir tomar a Vantagem, qualquer dos #iHunters pode recorrer à Vantagem, seguindo a restrição já citada de apenas um uso gratuito, os demais demandando PDs. Esse uso gratuito é “resetado” quando a Vantagem muda de lado.

Para determinar qual lado terá a vantagem, o narrador tem que analisar se:

  • Nenhum dos lados possui monstros ou ambos possuem e o nível de ameaça dos mais poderosos é igual e;
  • Não existe nenhuma vantagem que um lado tenha preparado para usar de maneira objetiva contra o outro.

Exemplo: Selena e Kyle estão caçando um vampiro de nível de ameaça 2. Como ambos são humanos e o alvo é um vampiro, na teoria um confronto entre ambos poderia gerar uma situação onde o Vampiro teria a Vantagem. Entretanto, Selena e Kyle são #iHunters experientes, e já prepararam algumas coisinhas para ajudar os mesmos contra o Vampiro. Como eles tem isso como Vantagens em mãos como Aspectos, por saberem que Esse Vampiro REALMENTE morre à luz do Sol e Ele é vaidoso demais para seu próprio bem. Com essas vantagens, o narrador pode dizer que ninguém tem vantagem ou mesmo que são os #iHunters que estão com a Vantagem devido a tal preparação.

Caso aconteça de não haver um lado que comece a cena com a Vantagem, ainda assim a Vantagem pode surgir pelos meios acima.

Os Monstros de #iHunt

#iHunt é sobre caçar monstros e sobre os questionamentos sobre isso. Claro que é muito divertido você mandar um FDP de um vampiro traficante de drogas e de prostitutas para a vala, alguém para quem o alemão tem até uma palavra (Backpfeifengesicht – procurem no Google.). Mas a questão é que #iHunt não é sobre isso exatamente: claro que existem caras que são Backpfeifengesicht de montão no cenário de San Jenaro onde se passa o jogo, mas isso não quer dizer que todos os monstros sejam assim. Na verdade, muito provavelmente eles são uma minoria, ainda que numerosa. Em #iHunt monstros não são alegorias: monstros são criaturas como quaisquer outras. Pense que Santa Clarita Diet é uma opção muito possível (e provável) em #iHunt. E às vezes você enquanto #iHunter vai se descobrir trabalhando para o FDP da vez (isso é que dá deslizar para direita em qualquer coisa).

De qualquer modo…

Monstros… Sem ele não existe caçada de monstros e sem caçada de monstros nada de #iHunt, e nada de grana.

Portanto, vamos a eles

Na realidade, o livro trás alguns moldes para os monstros (clades) que permitem que você não precise construir o seu monstros do zero. Na prática, todos os monstros pagam por seus Poderes (Gifts) e Habilidades(Features) com Recarga, recebendo Recarga adicional ao comprar Falhas (Banes).

E aqui entra uma coisa importante…

Nível de Ameaça (Star System)

Ao criar o seu monstro, você irá usar o Nível de Ameaça (de 1 a 5) para definir seu poder inicial. Ele diz quantos pontos o monstro tem para distribuir em seus pacotes de perícias, o maior nível que ele pode ter no mesmo e total de recarga que ele pode ter. A partir daí, distribua as coisas normalmente.

Quando houver a necessidade de usar o Nível de Ameaça em testes, como no caso de tentar-se obter a Vantagem, se for uma oposição passiva, utilize o dobro do Nível de Ameaça como dificuldade. Portanto, ao tomar-se a Vantagem de um monstro de nível 3, você deve no mínimo conseguir um rolamento acima de Fantástico (+6) (considerando que o rolamento oposto dele foi menor).

E isso puxa uma coisa:

É possível jogar-se com um monstro caçador de monstros (sim, estamos falando de Blade e Castiel aqui, senhores)?

Na prática sim. Se isso ocorrer, dê ao jogador 20 níveis para distribuir em seus Pacotes de Perícias e 5 Pontos de Recarga para gastar em seus poderes de monstro e coisas do gênero. Isso vai tornar o personagem muito poderoso, mas lembre-se que monstros possuem fraquezas bem sérias. Além disso, é necessário que o personagem tenha sido contaminado por um monstro previamente e isso pode não ser simples (muitas vezes é mais fácil morrer no processo, lembrando Um Lobisomem Americano em Londres)

Os tipos de Monstros e sua variedade

O sistema de Poderes, Características e Fraquezas torna criar monstros únicos algo razoavelmente simples se você tiver planejamento prévio. Entretanto, você pode não ter tempo de o fazer. Para isso, dentro de #iHunt existem modos de criar monstros tradicionais, mas com seu próprio twist. Além disso, existem as subclades, onde você compra algumas habilidades adicionais para definir subtipos específicos com fraquezas e poderes diferentes.

Dito isso, alguns deles são comuns… Mas com diferenças específicas:

  • Vampiros: nascidos da sede de sangue, são mais Bram Stoker e menos Crepúsculo, embora ainda possam andar à luz do sol sem brilhar ou derreter. Também não tem problemas com símbolos sagrados e convites (é rude, mas ainda assim podem entrar onde quiser quando quiser);
  • Feiticeiros: com a popularização do ocultismo e a troca de PDFs via Internet, de maneira geral os feiticeiros tem aumentado em números, vindos de todos os tipos e backgrounds. Entretanto, sempre são complicados, em especial quando arrumam uma cópia em PDF do Necronomicon (quem achou que isso era uma boa ideia?)
  • Lobisomens: a maioria dos lobisomens são nascidos assim e em geral conseguem lidar bem com “aquelas noites”. E na prática muitos não precisam de carne humana (jogue umas coxas de galinha cruas para eles e está de boa). O maior problema são os poucos que surgem de transmissões virais e os que piram na batatinha no processo de transformação. Algumas vezes ambos em um pacote só. Além disso, são muito territoriais, e se eles perceberem você aprontando em seus territórios, que Deus tenha piedade;
  • Reptoides: invasores alienígenas Illuminati que desejam dominar o mundo e devorar a humanidade… Hum… Ok, tire a parte do Illuminati: os reptoides em #iHunt não são exatamente espertos, mas são muito violentos. Não muito mais que o típico redneck eleitor do Trump, mas o suficiente para serem encrenca. Alguns se reproduzem ao estilo Alien o Oitavo Passageiro, o que adiciona injúria à calúnia;
  • Demônios:.. A coisa aqui é que nem todo Demônio vem do Inferno e nem todo é mal. Ok… A maioria é, mas ainda assim o que você precisa saber é que eles são poderosos e se alimentam de algum tipo de força vital específica. A Duqueza Infernal de San Jenaro mantem raves especiais onde ela se alimenta da adoração dos participantes por sua música eletrônica, que escutam e dançam até caírem extenuados. Porém, ela tem uma dieta meio restrita… Nada de balas e doces, se você me entende… Muitos #iHunters gostam dela, e os que não gostam e tentaram a caçar não estão mais entre nós;
  • Os Mortos Famintos: Walking Dead, Resident Evil, iZombie, Santa Clarita Diet… Todos eles tem um pouco da verdade sobre os desmortos, aqueles que por alguma razão morreram mas não permaneceram mortos! Há até mesmo aqueles que são altamente funcionais: mantenha os mesmos alimentados e eles podem até ajudar a caçar seus irmãos não tão favorecidos e os crimes que eles cometem (já vimos isso em algum lugar?)

A Essência

Por fim, vários dos monstros possuem algum tipo de medida de poder que eles tem para usar suas habilidades, por meio da Essência. Ela normalmente se carrega de alguma forma e é usada de maneiras diferentes conforme seus poderes: vampiros bebem sangue, Mortos Famintos devoram cérebros (ou outras partes), Feiticeiros realizam sacrifícios ou rituais para obter energia da natureza… Você entendeu.

Em certos monstros, a Essência também serve para determinar o quão desesperado ele está para obter a mesma. A Essência é dividida em cinco níveis (Faminto, Sem Alimento, Saciado, Cheio e Glutão) onde cada vez que um poder que demande Essência for usado e demandar o mesmo, a Essência cai em um nível.

A Essência também é um Aspecto no Monstro que pode ser usado, mas com uma diferença: cada nível de Essência fornece um bônus diferente para usos de Pontos de Destino ao invocar-se a mesma (chamado de Potência). Sempre que a Essência de um monstro aumentar, ele recebe uma invocação gratuita, e sempre que ela abaixar, a oposição recebe uma invocação gratuita. Isso torna um monstro muito perigoso quanto Faminto, mas #iHunters espertos (que chamamos de sobreviventes) costumam usar bem isso para atacar um Monstro quando ele está faminto e a Potência então voltar-se contra o mesmo.

A lista de Habilidades, Poderes e Fraquezas engloba muitas das situações tradicionais e explicam muito bem como as usar, assim como seus custos.

Jogando Seguro (ou “Fascistas não são bem-vindos”)

Antes de seguirmos adiante, ao falarmos dos monstros temos que falar sobre Jogo Seguro. Muitos poderes dos Monstros vão contra a agência do personagem. E isso pode ser extremamente chato para os jogadores. Além disso, muitas situações propostas em #iHunt são potencialmente gatilhantes: lembre-se que os personagens são gente fodida, que só se enfia em #iHunts porque a opção é o crime. Gente que já é vítima de esculacho o tempo todo por qualquer razão (incluindo nenhuma). Além disso, como você vai explicar para o policial (e lembre-se: em #iHunt, All Cops Are Bastards, todo policial é um babaca) que o CEO que você acabou de apagar na verdade era um Demônio que se alimenta do desespero provocado pelas demissões em massa de empresas falidas ou adquiridas por outras?

Para evitar isso, além de velhos conhecidos como o X-Card e o Controle Remoto, o #iHunt propõe um questionário similar ao visto em Consent in Gaming da Monte Cook Games, onde você detalha o tipo de coisas que você aceita ou não em jogo, e se você só topa se não te envolver. Além disso, existe o conceito do Intervalo Comercial, que é uma variação do X-Card: qualquer um pode pedir um Intervalo Comercial para respirar um pouco se as coisas saírem do controles (sempre um ótimo momento para a pizza com o refri). Dê um tempo, despressurize um pouco e depois volte para a ação

Pode parecer estranho isso, mas ao saber qual o espaço de manobra que você tem, fica mais interessante para você definir seus posicionamentos dentro do cenário. Afinal de contas, se ninguém tá no clima para homofobia, por que colocar isso? Para que chamar o personagem de “negão fedido” se o grupo não quer racismo na mesa?

Aproveitando… Se você é um fascista (enrustido ou não), #iHunt não é para você. Você não é o Constantine, no máximo você é um mal-amado (para não utilizar termo mais chulo) que precisa terapia (mesmo que isso signifique ter uma pia cheia de roupa suja para lavar).

Para deixar bem claro, como escrito no livro…

NO FASCISTS

If you’re a fascist, you’re not welcome to play this game. It’s against the rules. If you’re reading this and thinking, “You just call everyone you disagree with a fascist,” then you’re probably a fascist, or incapable of drawing inferences from context and acknowledging a dangerous political climate that causes the oppressed to be hyperbolic. Don’t play this game. Heal yourself. Grow. Learn. Watch some Mr. Rogers’ Neighborhood or something.

Ou no velho português:

NADA DE FASCISTAS

Se você é um fascista, você não é bem vindo nesse jogo. É contra as regras. Se você está lendo isso e pensando, “Porra, agora todo mundo que não concorda com você é fascista?”, então provavelmente você é um fascista, ou ao menos é incapaz de inferir coisas pelo contexto e reconhecer que temos um ambiente político perigoso que tornou aqueles que são oprimidos mais raivosos. Não jogo esse jogo. Vá se cuidar. Cresça. Aprenda. Vá assistir “Um lindo dia na vizinhança” ou algo similar.

#sendoumfodido

Você deve ter reparado que vivo usando o termo “fodido” para os #iHunters. E não tenho a menor vontade de me justificar, pois é a mais pura verdade.

Pense bem: que tipo de louco se enfiaria em uma pancadaria contra monstros sobrenaturais por grana por vontade própria, tendo opções melhores?

#iHunters não estão nessa por que querem, mas sim porque, de certa forma, o capitalismo falhou com eles, ou eles basicamente são onde o capitalismo externalizou todas as suas diatribes e todas as suas contradições: afinal de contas, para que pagar um tratamento para AIDS para todos? “Na hora de virar os olhinhos foi bom, né? Se fode aí.”

Dito isso, todo mundo dá seus pulos para sobreviver:

Existe um capítulo inteiro chamado #THINKPOOR mostrando como é você ser um fodido o bastante para se enfiar em #iHunting. Como é não saber se você vai ter almoço, conseguir roupas apenas por meio de doações do Exército da Salvação e usar a conectividade da biblioteca local para baixar um PDF que você precisa para estudar uma fraqueza de um monstro da caçada atual com aquele tablet que você comprou com parte da grana que ganhou na última caçada e que já tá com a tela quebrada e você não conseguiu trocar a tela pois você usou o dinheiro para comprar a insulina para sua diabetes (350 dólares na farmácia local), sendo que você ainda tem que pagar a luz!

Existe toda uma série de reflexões sobre o que gera o fenômeno de tantas pessoas recorrerem a economia de compartilhamento (spoiler: não é porque elas andam viciadas em cafés de grãos cagados por passarinhos), por que isso passa a sensação de incompetência (que é mítica) e sobre como pessoas de uma renda menor desenvolvem um estilo de vida onde ou elas se empanturram ou morrem de fome, onde elas compram o que podem porque não existe certeza de que terão o suficiente no dia seguinte.

Além disso, uma coisa importante: no capitalismo a riqueza é fetichizada. Ser rico é mais do que ter dinheiro: o dinheiro serve como demonstração de dignidade, de validação. O Dinheiro é melhor que Deus, por que garante poder, validação social, virtude. E alguém fodido não tem isso. Isso leva a necessidade que uma pessoa fodida teria para ter um carro pica, um celular top… Tudo isso te faz se sentir importante, validado diante da sociedade. Pense na cultura ostentação de rappers e de funkeiros.

E existe todas as explicações de como o sistema fode você: como o fato de você precisar de um comprovante de residência te fode para abrir uma conta no banco, o que te fode na dificuldade de receber seu salário. Como cada uma dessas pequenas merdas te fode a tal ponto que você acaba fodido de verde e amarelo.

E não é só nisso. São 26 páginas onde se comenta todas as formas, pequenas e grandes, como o sistema pode te foder e tudo que você pode fazer (legalmente ou não) para dar seus pulos e sobreviver para seguir adiante e, talvez, conseguir o que você deseja. Em especial, a sessão de #LIFEHACKS é muito divertida, com tudo o que você pode fazer para se virar, de tentar escavar lixo corporativo por peças velhas e manuais antigos de computador para vender no eBay como relíquia a coisas bem menos bacanas.

Mas é assim que é a vida de um fodido, e #iHunters em geral são fodidos. Você muitas vezes só tem péssimas escolhas a fazer, ainda que tenha que as fazer.

#iHunt – agora com novos recursos

Em uma outra sessão, é falado sobre a parte do programa #iHunt, e sobre como o próprio app te fode (sim… Lembre-se, você é um fodido. De outra forma, não estaria caçando monstros para complementar renda, para início de conversa)

A primeira coisa: no mundo de #iHunt, monstros sempre existiram. As pessoas apenas são educadas para ignorar coisas estranhas (como na nossa). Afinal de contas, se tem um cara meio acabado em uma cracolândia, o que é mais fácil acreditar?

  • Ele é um cracudo que escolheu isso?
  • Uma súcubo o drenou sexualmente e o viciou a ponto de ele ir parar nas ruas?

O #iHunt é um típico fruto da tecnologia da Web 3.0: mobile first (ou seja, depende de um número de celular, como o WhatsApp ou o Uber), viu um problema e “resolveu-o” por meio de um aplicativo. Mas quem está por trás da empresa #iHunt? Monstros tentando eliminar a escumalha sem sujar suas mãos? Caçadores utilizando o mesmo como prospecção de talentos? Ambos? Nenhum? Apenas alguém tentando fazer dinheiro em cima de um problema? Um Elon Musk da caçada dos monstros? Qual é a verdade? Elas são excludentes?

Basicamente, o #iHunt é tipo um Tinder ou Uber da caçada de monstros e funciona assim:

  • Alguém posta um pedido de caçada: não necessariamente matar, mas quase sempre trata-se de eliminar um problema. Ele define um preço pelo serviço e os algoritmos do #iHunt (sempre eles) definem qual é a dificuldade geral do alvo baseado nas informações do cliente (afinal de contas, ele não tem como avaliar por conta própria se o lobisomem é realmente perigoso)
  • Um #iHunter pode aceitar ou não o serviço, basta arrastar para a direita para aceitar ou para a esquerda para negar. Uma vez aceito, o #iHunter passa a poder interagir com o cliente por meio do aplicativo para tentar obter maiores detalhes e dar parecer do que está acontecendo. Se o negar, aquela caçada não aparece mais na sua lista (imaginando que o algoritmo – sempre ele – não endoide);
  • Uma vez que o #iHunter cumpra o serviço, uma selfie é enviada comprovando ao cliente que o serviço foi feito
  • O cliente confirma e avalia o serviço e dá uma nota ao #iHunter. Notas baixas pode resultar em descontos oferecidos pela plataforma (e descontados do valor do #iHunter) e o pagamento à mesma é efetuado.
  • O #iHunter tem seu valor final creditado pela plataforma em uma conta provida no cadastro, após cobrada a taxa do aplicativo;

E só por aí você pode perceber o tanto de merda que pode acontecer: alvos mal-avaliados, clientes insatisfeitos, clientes pegajosos, algoritmos falhando e dando o mesmo serviço para vários #iHunters, bancos que não aceitam os depósitos…

Tudo para te foder, óbvio.

Para ajudar, o #iHunt não aceita que #iHunters negociem valores por fora: isso pode levar ao encerramento da sua conta no serviço por violação dos termos de uso do aplicativo: sim, as porras das letras miúdas da EULA que ninguém lê.

E eles não se envolvem com grupos caçadores de monstros que já existam. Sim, eles existem e, sim, eles não são tão fodidos quanto você, tendo mais equipamento e conhecimento e experiência e treinamento de séculos caçando monstros. Algumas vezes eles podem te contratar via #iHunt para dar uma aliviada nos mais chinfrim e deixar o grande boss (que provavelmente vale muito dinheiro e tem uma caçada só para ele no #iHunt) para eles. Eles podem ver você e decidir te trazer para dentro dos seus números, com a vantagem de ter alguns benefícios melhores, até mesmo incluindo planos de saúde. Ou eles podem ficar muito putos porque você, um fodido qualquer, tá cumprindo uma “missão sagrada” caçando a caça deles…

E claro que existem apps para resolver o problema do #iHunt (afinal, there’s an app for that, sempre tem uma app para resolver tudo), desde um esquema atrelado ao #iHunt para caso um lobisomem te estripe e você precise que alguém faça seus órgão internos voltarem a ser internos sem muitas perguntas, até mesmo um sistema de armazenamento em nuvem onde você vai postar aquela cópia de O Rei em Amarelo em PDF que você pegou com seu colega Phooey: nunca se sabe quando precisará desenhar o Símbolo Antigo.

Sempre sem muitas perguntas, desde que a grana flua.

O Trampo

A cidade fictícia de San Jenaro é a típica cidade do Vale do Sílicio com monstros. É como se a Beauchamps de True Blood fosse teletransportada para o sul da Califórnia e ao invés de hamburgeres e comida cajun você tivesse comida vegana e café de grãos cagados por passarinhos (eu sei, essa piada está ficando chata… Vai acabar logo). Se você jogou GTA, deve estar entendendo o clima, apenas troque o crime por caçada de monstros. O cenário é bem detalhado, em sua opulência decadente e seu realismo com tapa na cara… De repente, o cracudo na rua era um #iHunter foda até ter seu cérebro transformado em geleia por vício em mordidas de vampiro, que ele tenta enganar com crack.

No caso, uma coisa interessante que #iHunt oferece é um gerador automático de Trampos (gigs), onde você pode gerar aleatoriamente todas as coisas que podem acontecer no trampo e as merdas que podem dar disso. Afinal, de repente você foi mandado para matar um vampiro, mas na verdade ele é bacana e o apenas quer proteger uma galera em uma região que é alvo de uma tentativa de gentrificação por parte do cliente… E aí?

E para aumentar ainda mais as incertezas, o #iHunt adiciona um novo mecanismo aos Aspectos que é Arriscar os Aspectos (imperish). Ao arrisca um Aspecto, além de oferecer 1 PD, o Narrador (ou quem o fizer, já que jogadores podem Arriscar Aspectos de NPCs) oferece duas escolhas potencialmente ruins. Tipo: você tá inundado de gasolina e o Monstro quer te matar, bebendo seu sangue. E aí? Você pode Arriscar um Aspecto Vivo por tempo demais para morrer do mesmo para impor um dilema: vai tentar a morder e com isso virar cinzas, ou vai fugir e deixar ela fugir.

A parte importante é que ambas as escolhas são potencialmente ruins para aquele que está tendo os Aspecto arriscado. Além disso, existem limites para usar isso: o Narrador pode usar apenas uma vez durante uma cena e contra apenas um PC. PCs só podem o fazer se, durante a cena, sofrerem uma consequência moderada ou pior.

Selfies – as cicatrizes de batalha dos #iHunters

Lembra-se que a caçada só é paga quando você envia uma selfie para o servidor e o cliente aprova? Em #iHunt sugere-se que isso se replique nas fichas de personagem. Cada marco do personagem gera uma selfie que, além de prover os efeitos tradicionais dos marcos, geram pseudo-Aspectos chamados callbacks. Cada callback permite que você tenha um determinado nível de benefício sempre que invocar eles for relevantes:

  • Marcos menores geram Climas maneiros que você pode usar, uma vez por episódio (sessão), para aumentar em +1 um rolamento.

Stella possui o Clima Maneiro “Uma vez mais celebramos mandar um sanguessuga para a vala”. Ela está caçando outro vampiro e lembra todas as discussões que ela e Helena, sua parceira (em todos os sentidos) tiveram enquanto estavam comemorando a caçada bem-sucedida em uma rave ao som de Daft Punk. Ela recebe +1 no rolamento para tentar localizar o vampiro

  • Marcos significativos geram Grandes Negócios, que você pode invocar como um Aspecto uma vez por sessão

Mikaela está pesquisando uns livros de ocultismo para encontrar informações sobre um demônio enquanto ouvindo “Bibbity-Bobbity Boo”, que é o nome de um Grande negócio onde, mó fita, ela descobriu em uma de suas primeiras caçadas que poderia usar magia graças a um demônio que na prática era apenas uma fada madrinha estabelecida em um barrio em San Jenaro. Ela lembra que louco foi sentar o “Bibbity-Bobbity Boo” na cara do babaca do cliente, e ainda ganhar uma grana com isso, já que o lazarento era ele próprio um demônio com uma caçada no #iHunt. Agora ela é uma aprendiz de fada madrinha e tem seu próprio negócio de personagens vivos! Isso a ajuda a se focar na investigação: afinal de contas, aquele vestido da Cinderela não vai se pagar sozinho!

  • Marcos Maiores geram Eventos Que Mudam Vidas, que você pode usar quando quiser, como se fosse um Aspecto seu, incluindo para ser Forçado ou ter o Mesmo Arriscado. Além disso, ele tem uma invocação gratuita, além dos benefícios normais, você pode usar o dado de Vantagem como se você estivesse com ele… Na realidade você não a tem, mas é como se a tivesse

Sergio possui um Evento que Mudou Sua Vida chamado O Incêndio da Escola St. Clerance, quando ele ao tentar expulsar um demônio acabou provocando um incêndio (chamas vindas do Inferno, cacete!) que resultou na morte de uma garota. Ele ainda se culpa um pouco, quando ele está caçando um lazarento de um fodido de um Faminto que, além de tudo, é um estuprador de crianças que por acaso trabalha para alguns vampiros da cidade, “amaciando” as crianças e quebrando sua resistência para que os mesmos possam satisfazer com elas sua sede de sangue, as “pegando de volta” quando não servem mais para saciar sua própria fome. Ele descobre tudo e olha, com sangue nos olhos para ele e fala: “Já mandei gente melhor que você para o inferno por bem menos. Mandar um puto como você vai ser um prazer. A grana do #iHunt virou só um bônus.” ele diz, lembrando daquela criança cuja vida ele vive por tabela

No #iHunt é sugerido que você mantenha um álbum de fotos com coisas relacionadas aos callbacks, literalmente selfies representando tais Marcos. Até mesmo você pode ir mais longe e estabelecer uma conta em rede social sobre seu personagem, ligada a de outros personagens. O céu é o limite.

Conclusão

#iHunt é sobre gente fodida, com opções de menos e com problemas demais. Pode parecer depressivo, mas pode ser bem mais interessante do que aparenta. É um material extremamente bom, uma das surpresas do final de 2019.

#iHunt tem um texto caustico e muito agridoce em muitos momentos. Ele serve para lembrar algumas coisas amargas das maravilhas que a tecnologia e o capitalismo tardio “trouxeram”, sobre como nossos cafés de grãos cagados por passarinhos (juro, é a última vez que vão ouvir essa) acabam resultando em toda uma economia que basicamente é um grande moedor de carne humana, onde certas carnes são mais baratas que outras.

Claro, você pode usar #iHunt para fazer seu típico jogo de “vamos matar o monstro da semana”, mas isso faz com que muito do tempero que torna #iHunt realmente divertido se perca. Embora exista muito pouco em regras que te obrigue a reforçar essa situação de ser um fodido, por outro lado o jogo perde um pouco do seu tom e fica meio comum, além de ingênuo, se esse fator não for reforçado.

A ideia de que os monstros não são o maior problema não é exatamente nova, sendo um tropo da Fantasia Urbana. Mas aqui a coisa fica interessante por você não conseguir dizer que exista alguém bom ou mal. Às vezes, você vai precisar matar aquela fada que protegia o parque onde uns sem-teto moravam em caixotes. Foda-se que as construtoras vão destruir tudo depois para construir mais um prédio para Faria Limers. Você precisa comprar o remédio para fibromialgia agora, não daqui a seis meses, e o posto de saúde onde você pegava ele fechou.

Não é um jogo para fracos de coração: você é um fodido e sabe disso. Você tem escolhas pesadas a fazer. Às vezes o que você precisa para espantar alguns diabretes faz várias vezes mais dinheiro no eBay. Algumas vezes, eliminar o monstro só quer dizer que outro ainda pior entra no lugar. Às vezes, nem quem ganhar ou perder vai ganhar ou perder, vai todo mundo perder.

O texto de #iHunt, como dito é caustico e agridoce, mas ao mesmo tempo cheio de um humor memético típico dos millenials, com seus rolamentos resultando em valores de 10-30 pontos de tensão (procurem pela meme 10-30), com uma fluidez sólida e em vários momentos angustiante. O capítulo #THINKINGPOOR é um dos maiores tapas na cara que alguém pode receber ao ler um jogo de RPG.

A diagramação é linda: definitivamente é um dos livros mais belos para Fate que já vi, senão o mais belo. Ao invés de muitas artes “inovadoras”, os autores utilizaram imagens de arquivo de imagens em Creative Commons ou com custo baixo e royalty-free para gerar uma diagramação bacana e enfatizada na ideia que que você é alguém que está vivendo em um tempo em que, ao mesmo tempo que se tem tudo, não se tem nada.

Esse é um livro que não consigo pensar em uma falha. É um jogo redondo, bem planejado, onde mesmo opções que não me seriam queridas (como o uso de 1d6 para a Vantagem) se mostram efetivas em game design. Talvez o ponto mais fraco seja o fato de que Monstros não são facilmente criados: não é difícil, mas precisaria daquele momento do comercial onde a galera come uma pizza e dá uma despressurizada de uma cena mais tensa (que pode potencialmente ter gatilhado um jogador) para você preparar o bicho. Os monstros de exemplo, porém, podem ser facilmente adaptados para o que você precisa.

Até a descrição do aplicativo do #iHunt e das falhas que o algoritmo do mesmo pode provocar e toda a questão envolvendo você receber (ou não) pela caçada é envolvente. Ele tem detalhes o bastante para deixar o cenário crível e realista, e buracos o bastante para se explorar todo o tipo de temática.

Eu dou um 5/5 sem muito medo para #iHunt, por sua capacidade de ser um produto bem acabado e bonito, cuja talvez sua única desvantagem seja estar em inglês.

Para quem quiser matar uns monstros e ficar um pouco menos fodido com um dinheiro extra…

É só deslizar para a direita em #iHunt!

Essa matéria foi escrita por:
Fábio Emilio Costa

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